quarta-feira, 27 de março de 2013

Carne



Às vezes eu gostaria de saber a distância entre meus lábios e a parede. Aquela que sempre olho de frente. Meu corpo quente de saudade. Minha pele ávida por um toque mais ousado, mais desobediente... E nem todo corpo é carne. E nem toda carne é alma. Porque um fogo lento e permanente me incendeia por dentro. Meus pecados todos. Incendiados para dar mais brasa àquilo que me queima a lucidez pouco a pouco. Segredos de confessionário. Sacerdotes horrorizados com meus mais profundos desejos. E o que vale está dentro dos limites da parede. Quatro delas. Lugar onde a decência não existe e, justamente por isso, aconchega. Planos de uma saúde comprometida depois de tanto alongamento. E o olho no olho. Suor gelado que escorre pelas tuas têmporas. Água de beber entre paredes. Se pode tudo. E mais um pouco. E um pouco mais... Boca de carne. Carne de pescoço. Às vezes. Só às vezes. Mas pescoço é bom também, se está inclinado no ângulo certo. Aquela parte bem próxima do cabelo. Aquela parte quase nuca. Que quase nunca é explorada. E desce capotando às ancas que estão obedientes entre os dez dedos das mãos de unhas perfeitas. Lambendo tudo. Agora mais para a direita, por favor. Ritmo. Ritmo é tudo numa hora dessas que não existe no relógio. Quatro paredes. Quatro pernas. De quatro. Numerologia do prazer infinito. Agora mais fundo. E a dureza de uma realidade sempre esperada. Mais uma vez. Os olhos quase saltando das órbitas. Um pouco mais. A carne do corpo tremendo. Quantas pessoas vivem em cada corpo? E o corpo é sempre de carne? Olhos nos olhos. Saliva que transborda da boca. E a parede atrás. O limite. Todas as quatro. Aqui dentro se pode tudo. Lá fora... bem... lá fora nem interessa mais. Olhos nos olhos e a saliva que se mistura com o suor que agora brota, ainda mais intenso, e corre as vielas até chegar na ponta dos cabelos. Água salgada que pinga no corpo salgado. Carne salgada. A distância entre minha boca e a parede diminui. Quase desaparece. Só restou meu grito abafado no teu peito. Hoje que já é amanhã vai nascer um dia lindo.




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